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LESÕES PRÉ-INVASORAS DO COLO UTERINO
COLO UTERINO
O colo uterino é uma estrutura fibromuscular revestido externamente (ectocervix) por um epitélio pavimentoso estratificado não queratinizado e internmente (endocervix) por um epitélio glandular cilíndrico. A junção desses dois tecidos epiteliais é denominado junção escamo-coluna ( JEC. )
Esta junção escamocolunar apresenta variações na localização dependendo do estado hormonal, gestacional, parto vaginal e trauma.
- Ø Em relação ao estado hormonal observa-se que na pré-pubere e na mulher em menopausa cujos níveis estrogênicos são menores há um deslocamento da junção escamocolunar para o interior do canal cervical, denominado de entrópio, exceto nas recém-nascidas que apresentam os níveis hormonais maternos quando a JEC ocorre na ectovercix. Durante a menacme cujos níveis hormonais estrogênicos são mais elevados encontramos uma eversão do epitélio glandular sobre o epitélio pavimentoso não queratinizado, o que denominamos de ectrópio.(1)
- 1 INTRODUÇÃO
EPIDEMIOLOGIA
As neoplasias intra-epieteliais escamosas do colo uterino (NIC) são alterações na maturação celular limitadas ao epitélio e classificadas de acordo com o grau e a proporção de células atípicas e dicarióticas.
O programa Viva Mulher,um programa Nacional de Controle do Câncer do Colo Uterino e de Mama, procura ampliar o acesso das mulheres brasileiras aos programas de detecção precoce e tratamento adequado das lesões precursoras do câncer do colo uterino (quadro 1)
Quadro 1- Citologias Oncóticas realizadas no Estado de Minas Gerais-Programa Viva Mulher (Siscolo)
FATORES DE RISCO
Estudos epidemiológicos relacionam o câncer do colo uterino e as lesões precursoras á atividade sexual, indicando o HPV (papilomavirus humano)como o fator causal de transmissão sexual. Além disso relacionam também ao baixo nível sócio-econômico , inicio de atividade sexual precoce, múltiplos parceiros sexuais, baixa imunidade, carências nutricionais, multíparas e fumantes. Alguns estudos sugerem o uso do anticonceptivo oral como fator de risco.
RELAÇÂO ENTRE HPV E CÂNCER CERVICAL
O câncer do colo do útero e suas lesões precursoras tem como agente causal certos tipos de papilomavírus humano (HPV), um vírus de transmissão preferencialmente sexual, que infecta a célula promovendo a integração do genoma do vírus ao do hospedeiro., com efeito citopático sobre as células escamosas do colo uterino (2).
Embora a infecção pelo HPV tem sido considerado uma endemia mundial, a grande maioria dessas infecções são auto-limitadas sem apresentar manifestações epiteliais ou evidência de anticorpos. A manifestação clínica persistente da infecção pelo HPV incluem as lesões exofíticas e as lesões intra-epiteliais neoplásicas.
As lesões exofíticas são comumente associadas ao HPV-6 e HPV-11. Os indivíduos que são sexualmente ativos têm um risco de infecção durante a vida de aproximadamente 10%.
O tempo da manifestação da lesão e o seu período de latência pode ser de meses, o que permite muitas vezes o paciente desconhecer a presença da infecção. No entanto, em sua forma exofítica e sua associação com doença sexualmente transmissível levam a depressão, ansiedade, diminuição da auto-estima e hostilidade ao parceiro.
2. MÉTODOS DIAGNÓSTICOS
2.1. CITOLOGIA-ONCÓTICA
A citologia é considerada um teste efetivo, modelo para rastreamento e detecção das lesões pré-cancerosas de alto grau ou câncer e menos efetivo para lesões de baixo grau. Resultado de metanálise mostrou que a citologia convencional tem sensibilidade de 51% a 58% e especificidade de 69% a 98% (2). Estudos recentes comparando a citologia em meio líquido com método tradicional mostram que são métodos equivalentes na identificação de células epiteliais anormais (3). A classificação de Bethesda de 2001 designou os tipos celulares e as diferenciou entre escamosas e glandulares (3).
ENTRA TABELA I:.
O SISTEMA DE BETHESDA 2001 – SISTEMA TERMINOLOGIA PARA RELATÓRIOS DE CITOLOGIA ONCÓTICA.
2.2 COLPOSCOPIA
ASPECTOS COLPOSCÓPICOS:
ü ACIDOFILIA: branca fosca, espessa, irregular, elevada em relação ao tecido normal. Corresponde área de extrema riqueza protéica das células displásicas.È um processo expansivo iniciado na junção escamo-colunar próximo ao orifício externo e que se estende sobre o colo ate sua periferia. A zona patológica apresenta uma base mais larga próximo ao orifício externo se alongando de maneira centrífuga, triangular ao vértice periférico.
ü MOSAICO E PONTILHADO: os pontilhados são relevos conjuntivos-vasculares do córion no epitélio patológico. Os mosaicos são construídos pela depressão dos brotos de epitélio proliferativo em profundidade. O mosaico é, habitualmente, muito delimitado, feito de ladrilhos irregulares e são tanto mais patológicos quanto mais amplos e abertos.. Os ladrilhos do mosaico são, habitualmente, demarcados nas suas partes centrais por um traço vermelho correspondendo a uma expansão vascular de gravidade importante.
ü ORIFÍCIOS GLANDULARES CORNIFICADOS: aberturas glandulares deformadas, em fenda, de diferente grau de gravidade, dependendo da quantidade de ceratinização e amplitude da fenda galndular.
ü PLACA LEUCOPLÁSICA: habitualmente situada no interior da zona patológica, caracterizado por um tecido branco espesso, em relevo,traduzindo um grau avançado de anormalidade.
ü IMAGENS VASCULARES PATOLÓGICAS: habitualmente situada no interior da zona patológica, representa um grau avançado de alteração celular na camada basal. As características das imagens são:
- o aspecto de vaso grosso, ríspido, sem arborescência sobre um trajeto relativamente curto, traduzindo o crescimento deste vaso em direção à superfície decorrente de um processo patológico subjacente;
- ocorrem também através de irregularidades de formas (aspecto em grampo de cabelo ou em saca-rolhas) ou de calibres, estes vasos podem ser até dez vezes maiores que o habitual.
ENTRA FIGURA 01.
LESÃO DE MOSAICO E PONTILHADO
IMPORTÂNCIA DAS NEOPLASIAS INTRA-EPITELIAIS CERVICAIS (NIC)
As neoplasias intraepiteliais cervicais (CIN) ou lesões escamosas intraepiteliais escamosas (SILs), são assintomáticas e não visíveis a olho nu.
Alguns autores (4) têm descrito a transformação atípica do colo uterino sob dois aspectos: através do processo de metaplasia e da zona de transformação. Caracterizam as transformações com atípica de grau I como parapatológico o que corresponde a uma reepitelização distrófica da ectopia (uma metaplasia imatura).È um processo fisiológico, sem gravidade, considerado um processo de cicatrização.
Sua visualização se destaca pela:
ü Epitélio escamoso imaturo com margem bem delimitada, brusca, quase que célula a célula, ao lado do epitélio escamoso maduro,
ü Apresenta células quase idênticas da profundidade a superfície, com alguma atividade nuclear de superfície,
ü Discreta paraceratose na superfície,
ü Total falta de estrogênio.
Por outro lado a transformação atípica grau II indica um desvio do processo de metaplasia com verdadeira proliferação patológica iniciado a partir da junção escamocolunar,(JEC). Segundo a Sociedade Francesa de Colposcopia essas transformações são classificadas em três graus: a, b e c. que corresponderia a um epitélio intacto, um processo de erosão inicial ou aspecto leucoplásico até um processo destrutivo com córion alterado e ulcerado.
A detecção da neoplasia intra-epitelial vaginal intra-cervical tem aumentado, refletindo provavelmente um melhor rastreamento pela citologia e colposcopia e acesso aos programas de prevenção do câncer ginecológico..(5)
As NICs são divididas em três níveis:
- NIC I: atipias celulares no terço inferior do epitélio,
- NIC II: atipias nos dois terços inferiores do epitélio,
- NIC III: atipias celulares em mais de dois terços de epitélio,
À colposcopia as lesões de baixo grau (NIC I ) tem aparência de lesões acetobrancas leucoplásicas, não coradas pelo Lugol®, como pontilhado fino.
ENTRA FIGURA 02:
LESÕES NIC BAIXO GRAU
As neoplasias intraepietliais de alto grau (NIC II , III), apresentam alterações colposcópicas tipo mosaico, orifícios glandulares cornificados, e vasos atípicos de intensidade variável.
ENTRA FIGURA 03
LESÕES NIC DE ALTO GRAU – ORIFICIO CORNIFICADO
3.TRATAMENTO:
3.1. OBJETIVO:
Identificação precoce das lesões precursoras que quando tratadas impeça a progressão de algumas dessas lesões para estágio invasor. Lesões de baixo grau se caracterizam por altas taxas de persistência e regressão expontânea, enquanto as lesões de alto grau tendem a progredir.
- Ø NIC I progressão para câncer 1%,
- Ø NICII progressão para câncer 7%
- Ø NICIII progressão para câncer >15%
3.2. NORMATIZAÇÃO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE PARA ACOMPANHAMENTO E TRATAMENTO(6)
Presença de células escamosas atípicas SEM células de alto grau
Recomendações para condutas frente às pacientes com laudo citopatológico de células atípicas compatíveis com lesão de baixo grau
2
Recomendações para condutas frente às pacientes com lesão de alto grau, não
podendo excluir microinvasão ou carcinoma epidermóide invasor:
Recomendações específicas de acordo com o laudo histopatológico
CONSIDERAÇÕES CLÍNICAS E RECOMENDAÇÕES
lesão de alto grau (NIC II – III) realizar cirurgia por alta freqüência(CAF), quando:
ü NIC confirmada por biopsia cervical, se possível
ü Se a lesão atinge o canal endocervical ou a ele se estende, o limite distal ou cranial da lesão deve ser visto; a extensão máxima (distal) não deve ser superior a 1 cm;
ü Não há evidência de neoplasia invasiva nem de displasia glandular;
ü Não há evidência de doença inflamatória pélvica (DPI), cervicite, tricomoníase vaginal, vaginose bacteriana, úlcera anogenital ou transtorno hemorrágico;
ü Pelo menos três meses no pós-parto;
ü Mulheres com hipertensão arterial controlada
A técnica tradicional com bisturi a frio utilizar quando:
- Ø A lesão estende-se ao canal endocervical e não é possível confirmar o grau exato;
- Ø A lesão estende-se ao canal endocervical e a extensão mais distal ultrapassa a capacidade de ablação da técnica de conização da CAF (profundidade máxima por ablação de 1,5 cm);
- Ø A lesão estende-se ao canal endocervical e a extensão mais distal ultrapassa a capacidade de ablação cirúrgica
- Ø A citologia é anormal repetidas vezes, sugestiva de neoplasia, sem alteração colposcópica correspondente do colo uterino ou da vagina suscetível para realização da biópsia;
- Ø A citologia indica uma lesão muito mais grave que a observada e confirmada na biópsia;
- Ø A citologia mostra células glandulares atípicas que indicam a possibilidade de displasia glandular ou adenocarcinoma;
- Ø A colposcopia indica a possibilidade de displasia glandular ou adenocarcinoma;
- Ø A curetagem endocervical com estudo histologico anormal.
Lesão de baixo grau (NIC I), sem acompanhamento regular, como tratar?
- Ø Métodos cito-destrutivos (cauterização química ou física, vaporização a laser CO²), sendo esse último o mais utilizado e adequado para preservar a anatomia, com melhor processo cicatricial e com melhor resposta imune,
- Ø Combinação de excisão e técnicas cito destrutivas,
Como proceder com o parceiro sexual?
Recomenda-se uma exame de peniscopia, principalmente, quando não há resposta ao tratamento da parceira. (C ).
A VACINA PARA HPV DEVE SER USADA?QUANDO? EM QUAL FAIXA ETÀRIA?
Existem dois tipos de vacinas disponíveis. Uma bivalente(subtipos virais 16 e 18) e quadrivalente (subtipos virais 16,18, 6,11). São vacinas profiláticas e não terapêuticas. A recomendação do uso em mulheres na faixa etária inicial de 9anos, ou aquelas sema atividade sexual e citologias negativas e exame colposcópio normal(ref.)
SUMÁRIO DAS RECOMENDAÇÕES
RECOMENDAÇÕSE E CONCLUSÕES FUNDAMENTADAS EM EVIDÊNCIA CIENTÍFICA CONSISTENTE ( NÍVEL A)
v 15-30% de citologia LSIL tem HSIL na histopatologia
v Citologia HSIL tem 70-80% de histopatologia de carcinoma invasor
v Lesões de baixo grau podem ser acompanhadas com citologia e dependendo da disponibilidade de colposcopia
v Citologia anormal devem ser direcionadas para exame colposcópico e biópsia dirigida
v Margem comprometida endocervical > realizar conização pós CAF
v A presença de DNA-HPV não altera as condutas delineadas para as lesões precursoras.
v Vacina bivalente e quadrivalente recomendada para mulheres
v entre 9 e 26anos de idade
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
- SELLORS JW, SANKARARANARAYAHNAN R. Colposcopia e Tratamento da neoplasia intra-epitelial cervical: Manual para principiantes.Washington, D.C.: OPAS, 2004.
- TRINDADE ES, PRIMO WQSP. Manual de Ginecologia Oncológica. MEDSI, Rio de Janeiro, 2004, p63-101
- ÇELIK Ç, GEZGINÇ K, TOY H, FINDIK S, YILMAZ O. A comparison of liquid-based cytology with conventional cytology. International Jornal of Gynecology and Obstetrics, 2008,100, 163-6\
- NGAN HYS, TRIMBLE CL. Preinvasive lesions of the cervix. International Federation of Gynecology and Obstetrics, Ed.Elsevier Ireland Ltda, 2006, S44-48.
- SOLOMON D, DAVEV D, KURMAN R, et al. Firum Group Members; Bethesda 2001 Workshop. The 2001 Bethesda System: terminology for reporting results of cervical cytology. JAMA 2002; 287 (16):2114-9.
- MARCHETTA J, BILHAUT JP. Transformações Atípicas. In MARCHETTA J, DESCAMPS P, Colposcopia – Técnica, Indicações, Diagnóstico e Tratamento. Livraria e Editora Revinter, 2007, 67-79p.
- Andrade JM ; Cury Jr. AJ, Jales A, Moraes A, Lopes AC, Urbano A, Malziner A, Ribeiro CA, Tosello C, Borrelli EL, Abdo Filho E, Mello ES, Laginha F, Baracat F, AbrãoFS, Alecrin I, Marques JA, Pascalicchio JC, Maia MAC, Miziara M, Nobre MRC, Castanho P, Novaes PE, Costa RLR, Ladeira S, Gonçalves WJ, Bernardo WM, Fristachi CE, Polido CE, Marziona F. Projeto Diretrizes: Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina Rastreamento, Diagnóstico e Tratamento do Carcinoma do Colo do Útero.Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Sociedade Brasileira de Cancerologia.16 de maio de 2001.
- EAG. HPV na Prática clínica. São Paulo: Editora Atheneu, 2005: 59-82.
- FRASE, IA. HPV vaccines. International Journal of Gynecology and Obstetrics, 2006, 94 (supplement 1), S581-588)
- Brasil. Ministério da Saúde. Viva Mulher. URL; htpp//www.inca.gov.br
- Brasil.Ministério da Saúde .SISCOLO/DATASUS.URL.htpp//wwwdatasus.gov.br
- RAMA CH. et al. Detecção sorológica de anti-HPV 16 e 18 e sua associação com os achados do Papanicolaou em adolescentes e mulheres jovens. Rev Assoc Med Bras, 52(1): 43-47, 2006.
- STAT bite: worldwide cervical and uterine cancer incidence and mortality, 2002. J Natl Cancer Inst, 98(15): 1031, 2006.
- FRANCO, EL. et al. Vaccination against human papillomavirus infection: a new paradigm in cervical cancer control. Vaccine, 23: 2388-2394, 2005.
TABELA I
O SISTEMA DE BETHESDA 2001 – SISTEMA TERMINOLOGIA PARA RELATÓRIOS DE CITOLOGIA ONCÓTICA.
CÉLULAS |
NÃO NEOPLÁSICAS |
CÉLULAS ESCAMOSAS |
Células escamosas atípicas de origem indeterminada (ASC-US) |
|
ASC-H : células escamosas atípicas que não se pode excluir a possibilidade de lesão de alto grau |
|
LSIL: lesão intraepiteliais escamosas de baixo grau |
|
HSIL: lesão intraepiteliais escamosas de alto grau |
|
HSIL com características suspeitas de células invasoras |
|
Carcinoma de células escamosas |
CÉLULAS GLANDULARES |
Células endocervicais atípicas |
ENTRA FIGURA 01.
LESÃO DE MOSAICO E PONTILHADO
ENTRA FIGURA 02:
LESÕES NIC BAIXO GRAU
ENTRA FIGURA 03
LESÕES NIC DE ALTO GRAU – ORIFICIO CORNIFICADO
Comentários
Querida Chirlei, eu adorei seu texto.
Você descreveu todos os detalhes com perfeição...
Ou seja, diante da sua abençoada sabedoria, eu pude acolher preciosas informações...
Deus abençoe você e sua família.
Beijos no coração.
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