- Crônicas
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Conversa de botequim.
- Me contaram que um político carioca ofereceu nacionalidade brasileira para o falecido Ronald Biggs – aquele famoso ladrão do assalto ao trem pagador na Inglaterra - e que, caso aceitasse, o transformaria em deputado estadual, federal e senador da república – disse um dos amigos.
- E o inglês aceitou? – disse o outro.
- Não. Alegou que seria impossível conviver com gatunos de gente pobre. Que ele era da turma do Lord Locksley.
- Quem é o Lord Locksley?
- O Robin Hood.
- No meu tempo de rapaz, para demonstrar indignação com a classe política, os eleitores votavam no Cacareco aqui no sul, e no nordeste votavam no Bode Cheroso, que não podiam cumprir mandato. Agora votamos em costureiro de miolo mole, cantor de cabaré e palhaço de circo analfabeto e alguns indivíduos tão confiáveis quanto um lobo faminto, e que cumprem mandato.
- São os ossos da democracia.
- Como assim?
- Bom, aqui no Brasil elege-se o Tiririca; na Itália um buffone de ópera do Gaetano Donizzetti; nos EUA, Conan - o bárbaro; no Egito ressuscitaram um Faraó, em pleno século XX; na Síria um Califa dos contos do Malba Bahan e por aí vai...
- Então a democracia é uma merda?
- Outros sistemas também são, quando a maioria dos que aceitam ou elegem seus representantes é composta de lacaios. No nosso caso, são de décima geração ou mais.
- Explica.
- Um país que batalha para sediar as Olimpíadas e Copa do Mundo de Futebol e tem 60% dos domicílios da sua população sem saneamento básico, e distribui comida ao invés de escolas e trabalho esta reinventando os regimes dos imperadores romanos – Panem et Circenses.
- Como é possível...
- Não seria possível com um povo educado e uma constituição decente sem tantas de redes de proteção para os políticos e poderosos mal intencionados. Nas palavras de um jogador de futebol precisamos melhorar o conhecimento e posicionamento do nosso adversário e chegar às urnas com um pouco mais de qualidade.
- Nazismo, Fascismo, Ditadura, Comunismo e Monarquia são experiências do passado que não dão certo, certo?
- Se o Adolfo não estivesse fazendo a siesta, com ordens para não ser acordado em nenhuma hipótese, depois de ter tomado um sonorífero, na hora que os seus generais imploravam o envio da Divisão Panzer para a Normandia, que estava sendo invadida pelos aliados – tá no filme “The Longest Day” -, o Nazismo não deixaria sobrar um só judeu no mundo para fundar o Estado de Israel, evitando assim a inveja dos vizinhos Árabes. A causa da gelosia é devida a que esse povo perseguido fertilizou a terra árida, que lhe coube em 1958, e tem nas exportações de alta tecnologia 50% do seu PIB. Já o Fascismo envergonhou os cineastas e intelectuais italianos e foi mostrado em filmes de forma burlesca.
- E as Ditaduras?
- Em Cingapura foi um sucesso. No Chile nem tanto. Na Argentina e na Babilônia uma carnificina. Na América Central e na África um fracasso.
- E no Brasil?
- Eternizou-se em alguns dos representantes da Câmara Federal e do Senado.
- O que você me diz do Comunismo.
- Na Rússia virou a Cosa Nostra; a China esta escalando a muralha construída pela dinastia Ming Ling Bing; em Cuba, apesar de um povo saudável e educado, esta faltando brilhantina pros homens e lingerie para as mulheres.
- Monarquia?
- A Suécia vive num regime absolutista e sua gente tem um padrão de vida invejado. Na Arábia Saudita até os Tuaregs tem ar condicionado e não andam mais de camelo no deserto. Na Zululandia e no Cuduquistão um desastre total.
- Quem diria...
- Olha só as ironias do nosso mundo: países invasores que promoveram guerras mundiais fazem parte do “conselho de segurança do ONU”. Os Estados Unidos que se arvoram “protetores da democracia” queimavam e penduravam nas arvores os negros insubmissos até antes de ontem e os brancos sulistas e republicanos continuam rindo, KKK.
- A humanidade não vale nada. Perto das misérias desse mundo de sempre o painel Guernica do Picasso poderia ser um afresco da capela sistina.
- Depois dos estragos causados na civilização antiga pelo Alexandre, Aníbal, Dario, César e outros facínoras menos votados o Criador mandou seu Filho aqui pra terra para ensinar os seus habitantes, tolerância, fraternidade, honestidade, compaixão... Sabe o que nós fizemos? Crucificamos o Redentor como agitador da ordem pública. Pregamos o Cara na cruz por insistir que a cobiça e a inveja iria acabar com a gente. A partir daí Seu Pai deixou que a gente se virasse sozinho.
- O que podemos fazer?
- Fumar um cigarrinho, tomar umas e outras e ver o Barcelona jogar.
- E as minas?
- Ahn!...
Nesse momento eis que entra no boteco o grande João Nogueira.
“Salve, como é que vai, amigo a quanto tempo, um ano ou mais, posso sentar-me um pouco, faça o favor, a vida é um dilema...
...
P.S.
- Não está com uma cara boa – sentenciou.
- Indigestão – replicou.
- De que?
- De realidade.
- Melhor entrar na fila – atalhou.
Diálogo de dois personagens do livro “O jogo do Anjo” de Carlos Ruiz Zafón.
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