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O ultimo adeus

mulher chorando Solange era uma mulher angolana, de família simples, que se esforçou muito pra estudar enfermagem, a profissão que tanto sonhara desde muito pequena...

Quando adolescente passou por uma fase difícil. Teve um namorado aos 16 anos e deste relacionamento surgiu uma gravidez indesejada. O pai da criança não quis assumir a responsabilidade e abandonou a moça.

Desesperada, a mãe de primeira viagem decidiu deixar seu filho na porta de uma casa que aos seus olhos parecia de uma família estável financeiramente. Embrulhou o menino em lençóis velhos e o colocou dentro de uma caixa de papelão, apertou a campainha da casa e saiu correndo pra não ser reconhecida. Foi para Moçambique, pois recebeu uma proposta de trabalho como agente de saúde, e esperava que pudesse ainda realizar seu sonho de ser enfermeira. Ela trabalhou muito. Estudava de madrugada para se preparar para o vestibular de enfermagem da Universidade Estadual de Moçambique. Não foi fácil, mas a jovem angolana foi aprovada. Após quatro anos de muito estudo, enfim, ela se formou enfermeira, e foi efetivada no Hospital das Clínicas, onde já estagiava há algum tempo.

Solange trabalhava à noite, das 19 até as 7 da manhã todos os dias, e no horário da tarde, fazia um trabalho voluntário em um hospital público especializado em pessoas cancerosas.

Sempre muito sorridente, nunca se queixou de trabalhar tanto e receber muito pouco e ainda ser voluntária no tratamento de pessoas tão carentes, muitas até em estágio terminal.

Em um dia chuvoso, ela saiu correndo do Hospital das Clínicas e foi direto pra sua lida diurna, e chegando lá foi surpreendida por uma movimentação muito grande na emergência. Prontamente, ela perguntou ao policial que estava na recepção naquele dia:

- Jorge, o que está a acontecer? Este hospital nunca foi tão movimentado assim...

- Ah! Senhorita Solange, chegou hoje aqui o filho de um dos governantes de Luanda, e ele está muito mal, quase a falecer com um coágulo no cérebro. Veio acá, pois em sua cidade não há hospital especializado...

Solange saiu às pressas e foi ver onde estava o tal rapaz. Ela ainda não tinha presenciado uma cirurgia de tão grande porte.

Chegando à sala de preparação para cirurgia, deparou-se com o rapaz franzino, pálido, olhos semi-abertos e quase sem vida. Se não soubera que era filho de um oficial, logo pensaria ser um mendigo moribundo.

Aproximou-se um pouco mais do rapaz, que com um esforço enorme abrira os olhos e olhou-a fixamente.

A moça com o coração em pedaços dirigiu-se ao chefe de cirurgia para pedir permissão para assistir a operação. Algo lhe dizia que veria ficar ao lado do rapaz durante a cirurgia. O médico respeitosamente falou:

- Senhorita, não é esta sua função. Vá para a enfermaria, lá muitos outros doentes precisam da sua atenção.

Solange muito decepcionada foi pra enfermaria com o coração na mão, não entendendo o porquê de tanta preocupação, afinal, nunca havia visto aquele homem e, além disso, estava acostumada a lidar com milhares de pessoas nos leitos do hospital.

Como ótima profissional, a dedicada enfermeira foi ao encontro de seus pacientes, que todos os dias esperavam por seu sorriso meigo e sua voz suave.

Quando passou no quarto de Luis Melo – italiano dos olhos azuis, fala mansinha, que foi visitar Moçambique e adquiriu malária- ele a olhou de rabinho de olho admirando a beleza daquela negra moçambicana que todos os dias passava por ali para ver o estado de saúde dele e de seus companheiros de quarto. Mal sabia ela, que durante tantos dias no hospital, aquele italiano alimentava por ela uma paixão platônica. Bastava um toque dela, mesmo que pra verificar a pressão arterial, que seu coração se enchia de alegria. Alegria esta contida, pois havia nele medo de revelar seus sentimentos. Era aquele seu último dia de internação, no dia seguinte iria ter alta e temia em nunca mais vê-la, ou sentir o seu toque.

No final do dia, Solange foi perguntar ao médico que fizera a cirurgia do jovem angolano, como sucedera a operação. O médico relatou que o estado do rapaz era grave, que metástases tomaram conta do cérebro e que uma cirurgia poderia pôr sua vida ainda mais em risco. Só um milagre poderia salvá-lo.

A jovem enfermeira entristeceu-se, foi à capela do hospital, e deu início a uma oração:

- Senhor, tenha misericórdia deste jovem rapaz que se encontra desenganado pelos médicos. Cura, oh! Senhor, seu cérebro e o faz ter saúde novamente... Não sei por que meu coração está tão abatido, mas me usa pra ajudar este menino que está longe de casa quase a morrer. Se não for da tua vontade salvar esta vida, a leve em teus braços ao lar celestial para que não sofra mais...

Ao terminar a oração, voltou ao posto de trabalho para pegar suas coisas e ir embora. Quando estava retirando o jaleco, uma companheira de trabalho deu-lhe a notícia:

- “Passou desta pra melhor” o jovem angolano.

Inconsolada foi para casa, alimentando o sentimento de culpa por não ter insistido com o médico-chefe sua participação na operação. Não dormiu a noite toda. Teve pesadelos horríveis. Lembrava-se a todo instante do jovem rapaz e juntamente com a lembrança do rapaz passava em sua mente flash’s da sua gravidez precoce, do parto e do momento em que abandonara seu filho recém nascido.

Acordou no outro dia muito triste. Todos ao seu redor não estavam entendendo o porquê de tanta tristeza pela morte de alguém que Solange nem conhecia. Seu semblante estava pesado.  Foi para a clínica e chegando lá se deparou com o pai do falecido jovem, foi até ele e disse:

- Senhor, sinto muito pelo acontecido. Não o conheço assim como também não conhecia o seu filho, mas estou fortemente abalada, como nunca estive em todos estes anos de profissão.

O homem com lágrimas nos olhos disse a ela:

- Obrigada. Mas Deus me deu esta criança quando ele era recém nascido. Sua mãe o deixou de madrugada na porta de minha casa, dentro de uma caixa de papelão. Ele estava envolto em lençóis velhos, com fome e chorando muito. Naquele dia eu estava muito deprimido, minha esposa havia falecido há um mês e não tínhamos filhos. Este menino foi a minha alegria por todos os anos. Ele quem me deu forças para continuar a vida. Tudo o que sou eu devo a ele. Foi Deus quem me deu e agora o levou para o lar celestial.

Solange ouvindo esta história caiu em prantos, porque se deu conta de que aquele jovem rapaz era seu filho e que precisou acontecer uma fatalidade para que eles pudessem se reencontrar. Este reencontro foi somente para dizer o último adeus.

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Atualizado em: Sex 15 Jan 2010

Comentários  

#8 Nayrib 06-03-2010 19:20
Grata pela visita e comentário tão carinhoso.
Volte sempre, será um prazer recebê-lo.
#7 Pamaro 03-03-2010 14:58
Conto muito bom, Nayrib. Curiosamente, escrevi 1 em que, no final, pai e filha se encontram, sem que, antes, ele nunca tivesse sabido da existência dela. Está no m/ livro "Contos & Casos". Parabéns e todas as estrelas. Beijo no coração. :ooo: :love:
#6 Nayrib 18-01-2010 12:11
É verdade... A vida é como é e toda decisão tem uma consequência ( queiramos ou não).
Obrigada pela visita.
#5 Cilas_Medi 16-01-2010 19:37
Bela e terna. A Vida e o encontro dos que nela vivem. Parabéns.!
#4 Nayrib 15-01-2010 18:29
Fico lislongeada com a delicadeza do comentário.
É bom saber que gostou da história.
Obrigada
Bjs
#3 AJO 15-01-2010 18:21
Fiquei igualmente apaixonado por Solange, sentindo-me transportado aos acontecimentos, sentindo o drama e profundamente triste por não poder ajudar... é essa a finalidade do escritor, de enviar seus leitores às situações diversas de seus personagens, incutí-los em seu sofrimento ou alegria, deixá-lo apreciando sua trama neuronial. Você sabe bem como fazer acontecer. Muito bom, gostei de verdade, de coração. Parabéns e todas as estrelas
Beijos
AJO
#2 Nayrib 15-01-2010 14:18
Obrigada. É ficção, não aconteceu realmente... só na minha imaginação.
Fico muito grata pelo comentário.
#1 master22 15-01-2010 14:17
Não tennho palavras...não sei se se trata de uma história real ou ficção de qualquer modo está divinal...
As estrelas todas e favorita
Parabéns

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